Mudanças na emissão e recepção de notas fiscais criam risco de bloqueio operacional e pressionam setores a acelerar adaptações internas.
A menos de três meses do início das obrigações práticas da Reforma Tributária, um levantamento revela que 72% das empresas de médio e grande porte ainda não iniciaram uma preparação consistente para ajustar seus fluxos de pagamento e processos fiscais — operação considerada crucial para manter o funcionamento das cadeias comerciais a partir de janeiro de 2026.
O estudo foi conduzido pela V360, plataforma de automação financeira, após consultar 355 companhias de setores como varejo, agronegócio, construção civil, indústria e tecnologia, sobretudo no Sudeste.
- Segundo o diagnóstico, apenas 28,1% das empresas possuem um plano estruturado de implementação;
- Outras 38,6% ainda estão em estágio de levantamento preliminar;
- 33,2% não iniciaram qualquer discussão interna sobre o impacto das novas exigências fiscais.
A Reforma demandará revisões imediatas nos sistemas de emissão de nota, que passarão a abrigar cerca de 200 novos campos relacionados ao CBS, IBS e IS. Embora o modelo definitivo avance até 2033, a fase técnica e operacional começa já no primeiro trimestre do próximo ano, com risco concreto de atrasos, falhas no faturamento e paralisação de pagamentos.
“A empresa que não ajustar seus processos — da emissão à liquidação — pode simplesmente parar”, afirmou Izaias Miguel, Co-CEO da V360. Ele reforça que o tempo é exíguo e que a preparação precisa ser “acelerada”.
Aspectos jurídicos e operacionais da transição
De acordo com Roberto Rached Jorge, mestre em Direito Tributário e pós-graduado em Direito Processual Tributário pela PUC-SP, o ano de 2026 funcionará como uma espécie de “fase de teste supervisionada” pela Receita Federal. Ele aponta que as sanções mais rígidas tendem a se consolidar apenas com o modelo em plena funcionalidade, a partir de 2027. Até lá, a falta de alinhamento pode gerar apontamentos formais, retrabalho, inconsistências na escrituração e atrasos na integração entre sistemas, especialmente na etapa inicial da transição
“Do ponto de vista jurídico, as empresas que não estiverem totalmente alinhadas podem enfrentar apontamentos, solicitações de esclarecimentos e eventualmente divergências na escrituração, mas as sanções mais rigorosas só devem ganhar força quando o modelo estiver plenamente funcional, provavelmente a partir de 2027”, disse o especialista.
A complexidade da legislação, a dependência de atualizações de software e a ausência de normativos finalizados são apontadas como fatores centrais para a tibieza na preparação.
Conforme explicou o especialista, muitas empresas esperam maior clareza normativa antes de movimentar estruturas internas, o que, na prática, pode resultar em gargalos na emissão de notas fiscais, falhas no fluxo de pagamentos e inconsistências no aproveitamento de créditos.
O levantamento aponta que grande parte das organizações está focada apenas na emissão de documentos fiscais, negligenciando o chamado ingresso fiscal, que envolve o recebimento, conferência e liquidação de notas emitidas por terceiros. Para a V360, esse será o ponto mais sensível da adaptação, dada a quantidade de novos campos obrigatórios e a necessidade de sincronização com sistemas financeiros e contábeis.
Outro desafio identificado é o processo de registro e manifestação de duplicatas escriturais, que se tornará obrigatório como forma de comprovação eletrônica das operações. A pesquisa aponta que 32,7% das empresas ainda não iniciaram a adequação.

