Há livros infantis que nos lembram que a infância, na sua essência, é movimento. Movimento do corpo, da imaginação, das emoções que ainda não têm nome — mas já existem. Pega a Bola! (Companhia das Letras), da premiada autora e ilustradora alemã Susanne Strasser, é exatamente isso: um convite para correr, rir, insistir e tentar de novo. Um livro que parece simples, mas guarda dentro dele a arquitetura precisa do brincar — aquela que dá ritmo aos dias das crianças e que, nós adultos, tantas vezes esquecemos.
A história começa com um pato e uma bola. Só isso. Ou melhor: tudo isso. O pato está numa brincadeira alegre quando… ops! Um chute forte demais e a bola foge rolando página afora. Na vida adulta chamariam isso de “frustração”. Na vida de uma criança, é só o próximo desafio de um dia que ainda está longe de acabar.
O mais bonito é que, a cada virada de página, um novo amigo entra em cena: o coelho, o cachorro, a vaca, o porco… uma pequena torcida organizada que cresce enquanto corre atrás da bola fugitiva. Susanne Strasser é mestre nesse tipo de narrativa acumulativa: repetição, humor e surpresa alinhados como um coro infantil. Ela já fez isso em livros como Uh-Oh! e Que Bagunça!, sempre com desenhos limpos, personagens carismáticos e uma cadência que conquista até os leitores mais mirins — inclusive os de um ano, como o meu Bento, que reconhece os animais antes mesmo de ouvir o texto.
Em Pega a Bola!, porém, há algo a mais: uma espécie de coreografia visual. O livro é quase um jogo. A repetição dos movimentos faz a criança antecipar o que vai acontecer, criando o delicioso efeito da participação — aquela mãozinha que aponta para a bola e diz “ali!”, aquele suspense dos olhos que brilham porque sabem que algo divertido está por vir.
A bola rola, a página vira, a equipe cresce. E, no fim, o gol que ninguém espera. Porque nos livros de Strasser, a graça não está apenas na chegada, mas no caminho percorrido — exatamente como na infância.
E há também um paralelo silencioso, desses que talvez só nós, mães, percebemos: perseguir uma bola que foge é também perseguir uma infância que corre rápido demais. A cada “vamos juntos?”, a cada risada, a cada tropeço dos personagens, a autora nos lembra da importância do coletivo, da amizade, da brincadeira compartilhada. A infância não é uma experiência solitária — e esse livro é quase um manifesto sobre isso.

